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Festival do Rio: “Ninguém Pode Provar Nada”

Publicado por Blog do Carlos Alberto Mattos, no dia 05/10/2025.

Em qualquer compêndio sobre transgressão no jornalismo e na produção musical brasileira não pode faltar o nome de Zeca Jagger, melhor dizendo Ezequiel Neves. O mineiro bateu todos os cartões da ruptura. Como jornalista, inventou matérias, declarações de artistas e até um disco inexistente de Keith Richards. Como ator, participou de vários filmes marginais. Como produtor, cruzou as fronteiras e tornou-se parceiro de Cazuza e do grupo Made in Brazil, entre outros. Na vida pessoal, fez apologia das drogas, frequentou banheiros gays e se envolveu em amizades turbulentas com Rita Lee, Roberto Frejat, Lucinha Araújo e por aí afora.

Seus textos incandescentes sobre rock estão no cerne do documentário Ninguém Pode Provar Nada, cujo título procura fazer jus ao personagem: A Inacreditável História de Ezequiel Neves. O diretor Rodrigo Pinto, também ele um jornalista cultural, mergulhou num farto material de arquivo e colheu depoimentos preciosos de gente como Nelson Motta (claro!), Jamari França, Ana Maria Bahiana, Frejat, Mauricio Kubrusly, Neville d’Almeida e Vania Toledo. Mas não acredite piamente em tudo o que você vê e ouve no filme.

Em sintonia com a verve profana de Ezequiel, temos atores fazendo o papel de personagens reais e o uso de inteligência artificial no engendramento de imagens e áudios. Numa cena, por exemplo, vemos Ezequiel entrevistar Mick Jagger, coisa que jamais aconteceu. Tenho dúvidas se realmente existe o filme Triste Horizonte, creditado a Neville d’Almeida, que aparece ilustrando os primeiros tempos de Zeca em sua cidade natal.

A pletora de arquivos às vezes parece excessiva, gerando uma montagem um tanto vertiginosa que mais estimula do que informa. Esse formato tem sido utilizado para evocar a própria velocidade do mundo pop, onde tudo converge para a fruição rápida e em seguida o esquecimento. A participação de Emilio de Mello no papel de Zeca não rende o que certamente se esperava. Ainda assim, e mesmo com a voz pastosa e enjoativa da maturidade, Ezequiel ganha um pouco mais de perenidade com esse documentário. O “avô do rock brasileiro”, o “proto-influencer” (termos  citados no filme), para quem “enquanto houver burguesia não vai haver poesia”, recebe aqui o tributo que merecia. Exagerado e transgressor como ele.    

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https://carmattos.com/2025/10/05/festival-do-rio-ninguem-pode-provar-nada/